segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Ele há mesmo gajos assim

A Câmara Municipal de Lisboa decidiu, e bem, que eram necessários táxis acessíveis.
A possibilidade de as Câmaras atribuírem alvarás para táxis acessíveis está prevista na lei há alguns anos. Hajam mais Câmaras a fazer o mesmo.

A reacção do presidente da antral, o sr. florêncio almeida, foi, cá para mim, no mínimo nojenta, ou para ser mais simpático, asquerosa.

Dizia o sr.:“eu próprio não gosto de ser conotado com o que não sou”.

Estava ele a falar de ser conotado com as pessoas que têm uma deficiência e precisam de ir para o emprego ou fazer compras ou que , sei lá... até são capazes de querer ir num sábado á noite para a 24 de Julho.

Estava este sr. a argumentar com a inviabilidade económica dos táxis acessíveis porque ninguém quereria andar naqueles veículos do demo, não fosse a deficiência ser assim uma coisa contagiosa.

sr. presidente, garanto-lhe, tenho uma paraplegia há 30 anos e nunca a “peguei” a ninguém.

Aqui, já de seguida, vão duas reacções à reacção do sr. presidente.

Ainda há quem esteja atento a estas coisas. Nós agradecemos.

Incluir? Não obrigado!

Num país onde a esmagadora maioria de pessoas portadoras de deficiência são obrigadas a ficar em casa por não terem condições para vencer os obstáculos na rua, é perverso ouvir declarações públicas feitas por pessoas aparentemente responsáveis que se recusam a dar passos para incluir os mais frágeis.

Falo de Florêncio Almeida, presidente da Antral, que explica com toda a eloquência possível que "não há mercado" para este tipo de transporte e que "as pessoas sem deficiência não querem viajar em táxis próprios para deficientes". Inspirado, Florêncio Almeida, vai mais longe e admite: "eu próprio não gosto de ser conotado com o que não sou". Extraordinário raciocínio, este. Mas há mais e continuo a citar o que li no Público de dia 22 de Agosto: "o que eu quero é trabalhar e não fazer serviço social". Bravo! Uma boutade pareceu-lhe pouca coisa, duas ou três de enfiada deram-lhe certamente outra assurance discursiva.

Pois bem caro Florêncio a serem verdade, estas suas afirmações falam por si e infelizmente dizem o pior. Mostram uma total insensibilidade e revelam uma ignorância chocante. Isto para não falar da falta de estratégia empresarial e da ausência de sentido do negócio. Mas vamos por partes.

Ao contrário de Florêncio Almeida, a maior parte das pessoas que não tem handicaps físicos sente-se muito mais confortável quando anda em transportes onde há lugares ou circunstâncias adaptadas aos deficientes do que quando percebe que estes foram completamente excluídos.

É completamente falso que os ditos normais se recusem a apanhar um táxi adaptado para pessoas com necessidades especiais. Aqui e em qualquer lugar todos ganhamos com a inclusão e por isso é bom que Florêncio Almeida fale por si, coisa que obviamente não pode fazer por ser presidente de uma Associação que representa uma classe com milhares de profissionais.

Uma coisa é as pessoas sem handicaps não se lembrarem que são precisas adaptações, outra radicalmente diferente é estas mesmas pessoas recusarem estas adaptações com argumentos patéticos. Nesta linha é bom que Florêncio Almeida separe as águas e não amplie uma voz distorcida.

Quanto a não gostar de ser conotado com o que não é, neste caso particular com pessoas com deficiência, cada um sabe de si. Eu lido perfeitamente com todos os tipos de deficiência e a única que verdadeiramente me incomoda é a deficiência moral. Essa sim, incomoda-me por revelar pobreza de espírito e indigência moral, passe a redundância.

Finalmente a questão do serviço social. Numa época em que todos temos consciência de que o empreendedorismo e a responsabilidade social das empresas são uma aposta ganha à partida, não fica bem a ninguém defender o indefensável. Se Florêncio Almeida não faz nem quer fazer que se chegue para o lado e deixe que outros façam o que tem que ser feito.

Uma cidade como Lisboa precisa urgentemente de táxis adaptados para deficientes, para velhinhos com bengalas, para pessoas frágeis ou doentes, para homens e mulheres que fizeram operações graves, para pais e mães que têm filhos pequenos ou bebés de colo e, quem sabe, até para um dia o próprio Florêncio Almeida poder transportar algum familiar ou amigo que tenha dificuldades de locomoção. Contra estes factos não há argumentos. Ou há, senhor Florêncio Almeida?

Texto de Laurinda Alves, tirado daqui



O Senhor Comentador aplaude a Câmara de Lisboa pela iniciativa dos táxis adaptados a deficientes

Há um projecto bem intencionado da Câmara de Lisboa para incentivar a adaptação de táxis ao transporte de pessoas com dificuldades de mobilidade. Contudo, o Presidente da Antral, Florêncio Almeida, defende que "não há mercado" para este tipo de transporte. Entre outras objecções acrescenta que "as pessoas sem deficiência não querem viajar em táxis próprios para deficientes. Eu próprio não gosto de ser conotado com o que não sou". Eu percebo o Florêncio: eu também não gosto de ser conotado com o que não sou. Embora nunca me passaria pela cabeça usar a palavra "conotado". No entanto, discordo do nosso presidente da Antral. O problema não é a falta de deficientes de mobilidade. Há imensos. Só que não gostam de o reconhecer. Devia haver uma campanha a explicar às pessoas com deficiências que não são as outras pessoas que se movem com rapidez mas que são elas que não se movem. Mas percebo que uma campanha de consciencialização de deficientes, além de custosa, pode ser embaraçosa. Como é que se diz a alguém que está habituado a ser como é que de facto o normal é não ser como ele? Podemos apanhar um deficiente com formação filosófica que pergunte: "Como é que tem a certeza disso?" E pronto. Aí acabou o conceito nobre de compaixão para sermos enterrados no fundo da nossa suposta e arrogante normalidade. Mas pondo de parte a óptica de angariar clientela para reflectir sobre como as pessoas ditas normais não aceitariam ser confundidas com deficientes, devo dizer que o Florêncio se engana rotundamente. Para começar, quem tenha ido a uma casa de banho com a alternativa só para "deficientes", verificou que o dito compartimento sempre é mais limpo e tem um ar mais confortável do que os vulgares nichos de evacuação fisiológica dos ditos normais. A razão dessa extrema limpeza é óbvia: eles são menos e a sua manutenção higiénica está facilitada. Se fazemos uma transposição simples, podemos imaginar que os táxis para deficientes serão também mais limpos e os seus condutores menos stressados. Até diria mais: iam estar mais contentes por não terem de andar a subir e descer do carro por causa do cliente. Os clientes, por sua vez, sentir-se-iam mais confortáveis porque normalmente este tipo de carros está feito para facilitar tudo. Habitualmente são mais espaçosos (ninguém sabe o que um deficiente pode trazer consigo) e claramente mais limpos (os deficientes que podem andar de táxi são normalmente mais limpos que os que andam a pedir na rua. Eu, que gosto de andar de táxi quer em Lisboa quer no Porto, não hesitaria em optar por um carro adaptado a deficientes. Por isso não concordo com o que Florêncio Almeida diz - que não gosta de ser conotado com o que não é. Eu também gosto de ser bem tratado e ser transportado tão educadamente num carro limpinho como aqueles que a Câmara de Lisboa quer promover. Estou a favor dos táxis para as pessoas com dificuldades de mobilidade, com a condição de não serem mais caros nem exclusivos. Estamos todos com dificuldades. Fora isso, tudo bem.

Texto de Carlos Quevedo, tirado daqui

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