Pagar menos imposto porquê?
Porque a desigualdade de oportunidades e as despesas acrescidas que têm as pessoas com deficiência são-lhes impostas pela sociedade, que não se pode desresponsabilizar desse facto.
As pessoas com deficiência para se qualificarem, conseguirem ter acesso ao mercado de trabalho e manter o seu emprego têm de ultrapassar inúmeras barreiras. Não só as físicas e comunicacionais como também as barreiras dos preconceitos e atitudes que lhes dificultam uma actividade profissional em igualdade de circunstâncias com os seu colegas de trabalho.
O Dr. Vital Moreira, por exemplo, se andasse de cadeira de rodas, teria tido muita dificuldade em frequentar a Faculdade de Direito em Coimbra, não teria sido Deputado porque não poderia entrar no Parlamento, no Tribunal Constitucional a mesma coisa, etc. etc.. Não teria decerto as experiências ao longo da vida que lhe possibilitaram ser o que é hoje. Seria muito provável que o Dr. Vital Moreira não fosse hoje o Dr. Vital Moreira que conhecemos. Tinha muitas probabilidades estatísticas de ser "apenas" o Sr. Moreira.
Perceberá isto o Dr. Vital Moreira? Pensamos que a maior parte dos portugueses percebem.
Quanto à justeza do actual sistema, Vital Moreira ainda não percebeu o que está em jogo.
As pessoas com deficiência não são todas iguais, ao contrário do que julga. Como todos os cidadãos portugueses temos qualificações, capacidades e actividades profissionais muito diversas.
A perda de rendimento derivada da deficiência, que importa compensar, não é uniforme nesta sociedade. Esta sociedade é injusta? Na minha opinião é, mas não é disso que estamos a tratar agora. O canalizador que lhe arranja a fuga da torneira também não ganha o mesmo que um professor de direito.
O exemplo que aponta, em abstracto, de duas pessoas com o mesmo tipo e grau de deficiência que têm compensações fiscais muito diferentes, não quer dizer nada. A perda de rendimento dessas duas pessoas pode ser, e é de facto, também muito diferente, dependendo da actividade que exercem.
Dirá Vital Moreira que não é possível determinar, caso a caso, essas perdas de rendimento e eu estou de acordo.
O problema é que o governo decidiu alterar o sistema existente, que vigorava desde 1998, sem fazer qualquer estudo que quantificasse esses custos. Legislou sem saber do que estava a tratar. Para ter uma ideia, em Barcelona chegaram à conclusão que esses custos seriam em média, para os diversos tipos de deficiência, 31.000 euros anuais (pode ver esse estudo aqui). O governo português quer compensar essa perda de rendimento com 1.410 euros.
Reclama Vital Moreira que este sistema é socialmente mais justo. Que se tira aos ricos para dar aos pobres.
Também acho que os impostos têm uma função de redistribuição e atenuação das desigualdades sociais. No entanto, neste caso, porque será só a comunidade das pessoas com deficiência a ter esse encargo, quando a culpa da diminuição de rendimentos de que estamos a falar tem origem na sociedade em geral e não nas pessoas com deficiência?
Diz ainda Vital Moreira que este sistema de cálculo vai beneficiar “todos por igual incluindo os que, não tendo rendimento para pagar IRS, não eram sequer contemplados no anterior regime”.
Tal como o Sr. Ministro, Vital Moreira ainda não reparou que duas pessoas com o mesmo tipo e grau de deficiência podem continuar a ter "benefícios" que vão dos 0 aos 1410 euros. Isto porque para deduzir 1.410 euros à colecta é preciso, lá diria o Sr. La Palisse, ter rendimentos suficientes para ser colectado em pelo menos 1410 euros. Como só 26,2% da população com deficiência tem emprego, (dados de 2001) e desses, 58% ganhavam até 3 salários mínimos (dados de 2004), não serão muitos a chegar aos 1410 euros.
Também não reparou ainda que, comparando com o regime de benefícios fiscais que existiu até 1998, qualquer pessoa com deficiência, solteira, "rica" ou pobre, sai prejudicada com o novo sistema. Será que as pessoas com deficiência têm de casar, de preferência com quem ganhe o suficiente para ter uma dedução à colecta superior a 1410 euros?
Haverá sim, sabemos isso, um aumento de rendimento das famílias que têm pessoas com deficiência a seu cargo, desde que, mais uma vez, tenham rendimentos suficientes para abater à colecta. Quantas são, não sabemos. Mas, por isso mesmo, a nossa proposta é que se reponham os benefícios fiscais e se mantenha a decisão do governo de abater à colecta pelo menos os tais 3,5 salários mínimos, podendo as pessoas com deficiência e as suas famílias optar pelo sistema de cálculo mais favorável.
Não me parece, no entanto, que seja por via fiscal a forma mais eficaz para melhorar as condições de vida das pessoas com deficiência que não têm capacidade ou oportunidade para gerar um rendimento condigno.
Será através de verdadeiras políticas de reabilitação e inclusão social que passam, entre outras coisas, por assegurar a autonomia e condições de vida dignas para essa pessoas.
Melhor seria que o Dr. Vital Moreira exigisse ao governo, no seu blogue, o aumento e revisão das condições de atribuição das pensões sociais de invalidez. Quem é que pode viver com 193,43 euros, tendo ainda por cima uma deficiência?
Antes de nos chamar oportunistas, leia as nossas propostas Dr. Vital Moreira!
Jorge Falcato Simões
Nota: Seria bom que o Dr. Vital Moreira abrisse a possibilidade de os seus leitores comentarem os textos que vai escrevendo. Pela minha parte tem aqui uma caixa de comentários à disposição.
3 comentários:
Estou de aordo com este post, embora me pareça que não valha a pena gastar cera com ruim defunto, no caso o Dr Vital Moreira que nem permite comentários no seu blog.
E de isto tudo acho muito preverso e de muita má fé o método seguido: primeiro reduzir/acabar com os benefícios fiscais e depois (talvez) estudar a coisa.
É assunto para, bem estudado e bem digerido, se resolver em menos de um ano, muito a tempo desta legislatura
Mas para isso teria que haver vontade política de resolver isto honestamnte... o que parece que não há.
Deixei ontem este comentário que por lapso seguiu sem identificação; aqui está a rectificação - FGMBarreiros
O Tourais ontem deu-lhe bem no pa�s do burro he he he
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